A perda de memória é, sem dúvida, o sintoma mais conhecido da demência — especialmente da Doença de Alzheimer. No entanto, o processo de adoecimento do cérebro pode começar silenciosamente, e os primeiros sinais nem sempre envolvem esquecimentos. Identificar essas manifestações iniciais pode ser essencial para o diagnóstico precoce e a adoção de medidas que preservem a autonomia da pessoa idosa por mais tempo.
A seguir, descrevo cinco sinais menos comentados, mas que frequentemente aparecem nas fases iniciais das demências. É importante lembrar que, isoladamente, nenhum deles é diagnóstico. Todos podem ocorrer por outros motivos — cansaço, estresse, depressão, outras doenças. O que deve chamar a atenção é sua persistência, a associação entre eles e o impacto no cotidiano.
1. Mudanças de Personalidade
Pessoas em estágios iniciais de demência podem apresentar uma redução na extroversão, na afabilidade (capacidade de manter boas relações interpessoais) e na responsabilidade com tarefas do dia a dia, mesmo antes de qualquer queixa de memória.
Essas mudanças de personalidade tendem a acompanhar toda a evolução da doença, mas, no início, podem ser muito sutis: um indivíduo antes sociável passa a recusar convites, evita conversas, parece mais fechado ou indiferente.
Uma das alterações mais comuns é a perda de organização e do senso de responsabilidade. Alguém antes metódico pode começar a esquecer compromissos, deixar tarefas pela metade ou demonstrar desinteresse crescente pelas obrigações diárias.
Em alguns tipos de demência, como a demência frontotemporal, essas alterações se tornam ainda mais evidentes: a pessoa pode se tornar menos empática, mais impulsiva ou grosseira — comportamentos ligados à degeneração de áreas específicas do cérebro responsáveis pelo autocontrole e pela convivência social.
2. Dificuldades com o Dinheiro
O manejo financeiro exige atenção, memória, julgamento e organização — ou seja, um complexo conjunto de funções cognitivas. Por isso, alterações nessa área podem surgir precocemente em alguns casos de demência.
É possível observar que a pessoa começa a esquecer prazos para pagar contas, perde o controle de gastos, realiza compras repetidas ou desnecessárias, ou se torna vulnerável a fraudes e golpes. Em pacientes que sempre foram financeiramente responsáveis, esses sinais podem ser particularmente marcantes.
Mesmo antes de esquecimentos evidentes, alterações no planejamento financeiro e na tomada de decisões devem ser motivo de atenção. É uma área sensível e, frequentemente, fonte de conflitos familiares — especialmente quando não se reconhece que essas falhas podem ser causadas por um transtorno neurológico em curso.
3. Problemas de Sono
Embora algumas queixas sobre a qualidade do sono são frequentemente relatadas tanto por adultos jovens quanto velhos, alguns distúrbios do sono são particularmente associados ao maior risco de algumas demências.
Um exemplo notável é a ocorrência durante o sono de movimentos vigorosos e complexos que aparentam reproduzir o que está ocorrendo nos sonhos. Frequentemente, este quadro causa ferimentos tanto para o indivíduo ou para o seu parceiro(a) de cama. Esta manifestação dramática que ocorre em fases profundas do sono, fases estas associadas aos sonhos, ocorre porque a área do cérebro responsável por paralisar temporariamente os músculos (atonia muscular) durante os sonhos pode estar comprometida.
Esse quadro, chamado de Distúrbio Comportamental do Sono REM, é um forte marcador neurológico e pode anteceder em muitos anos o surgimento de sintomas cognitivos em doenças como a Doença de Parkinson e a Demência com Corpos de Lewy.
4. Dificuldades ao Dirigir
A condução de um veículo é uma das tarefas mais complexas do ponto de vista cognitivo. Ela exige atenção, julgamento rápido, memória operacional, coordenação motora e adaptação constante a estímulos ambientais.
Por isso, pequenos acidentes ou “quase acidentes” em motoristas antes considerados outrora cuidadosos podem ser os primeiros sinais de uma perda gradual dessas habilidades.
Parar no meio do cruzamento, esquecer o caminho habitual, não perceber um sinal vermelho ou demorar excessivamente para reagir são exemplos clássicos.
É importante, no entanto, destacar que alterações visuais, efeitos colaterais de medicamentos e problemas musculoesqueléticos também devem ser considerados, mas o comprometimento cognitivo precisa estar no radar. Saber identificar esses sinais precoces pode fazer toda a diferença na segurança e na autonomia dos idosos.
5. Perda de Olfato
Perder o olfato ou notar que os aromas estão menos intensos pode parecer apenas um detalhe — ainda mais quando isso ocorre de forma gradual ou já é um incômodo antigo. Mas, na geriatria, essa queixa aparentemente trivial pode ser uma pista precoce de algo mais sério.
As regiões do cérebro responsáveis por processar os cheiros estão entre as primeiras a serem afetadas em doenças neurodegenerativas como a Doença de Alzheimer, a Demência com Corpos de Lewy e a Doença de Parkinson. Por isso, quando uma pessoa passa a não perceber aromas fortes — como perfume, café ou alimentos estragados — e não está resfriada nem com problemas nas vias respiratórias, é importante investigar.
Estudos mostram que a perda de olfato pode anteceder os sintomas clássicos da demência por vários anos, sendo um marcador presente em um número expressivo de casos.
Além de ser um sinal clínico importante, essa perda sensorial também tem impactos diretos na segurança — como não perceber um vazamento de gás — e no prazer de comer, o que pode comprometer o apetite e a nutrição.
Diagnóstico Precoce e Cuidado com a Pessoa Idosa
Sou médico geriatra e, há mais de 15 anos, acompanho pessoas idosas em diversas fases da vida — inclusive nos momentos mais desafiadores, como o surgimento de sinais de demência.
Na minha prática, combino escuta atenta, conhecimento clínico e experiência acumulada para identificar alterações precoces que muitas vezes passam despercebidas. Posso ajudar você a entender se mudanças recentes no comportamento, sono, finanças ou hábitos cotidianos podem ser indicativos de algo maior — e orientar os próximos passos com sensibilidade e responsabilidade.
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